terça-feira, 30 de outubro de 2007

Fases de um dia de pesca! - 24/Set/2007


Um dia de pesca implica um conjunto de acções físicas e mentais que, muitas vezes, se iniciam na Segunda Feira anterior, isto para quem trabalha, o que acontece à maioria de nós, pescadores!
Sinceramente, isto de trabalhar, não é normal! O homem fez-se para pescar, caçar, pensar, ... Procriar!?
Mas enfim! As relações do mundo são o que são, e tivemos que nos habituar a esta escravatura semanal!?
Pessoalmente, na Segunda Feira que se segue a um fim de semana de pesca, assim que termino o trabalho, costumo vir aqui ao blog, penso no que se passou na pesca anterior, e, após consulta do tempo para o fim de semana seguinte, inicio as tomadas de decisão e começo a delinear os passos a efectuar em função das decisões tomadas.
Das acções a desenvolver, constam:
- O acompanhamento diário da evolução do estado do tempo, cujas alterações poderão influir drasticamente nas decisões inicialmente tomadas ou até, tornar impossível a prática tão desejada!
- A manutenção do bem estar familiar! Pois não é bom, termos o pessoal lá de casa "de candeias às avessas" conosco, às vezes, por coisas sem qualquer importância e mantermos essas situações até ao fim de semana seguinte! É mau para tudo e para todos! Não sei se me faço entender!? Claro que este cuidado, eleva a Pesca a elemento essencial de equilíbrio familiar! Quem diria?
- Trabalhar até mais tarde, se necessário, de forma a evitar que coisas deixadas para trás, nos obriguem a trabalhar no fim de semana! Porque sabemos que do trabalhinho depende potencialmente a pesca!
- Consultar a carta de pescas! A pesca embarcada, seja qual for a modalidade, implica uma consulta contínua da carta, pois descobrimos sempre novas zonas e hipotéticos pesqueiros a testar!
- Manter viva alguma informação sobre o que se passou com as pescas, durante a semana, na zona onde costumamos pescar, tentando perceber os tipos de capturas e os pesqueiros ou zonas mais prováveis, em termos de localização. Isto, sem confiar totalmente nos informadores, tentando descodificar as conversas "em letra pequena" e sem nunca perguntar sobre o local exacto! O pessoal normalmente não gosta e a informação poderá sair ainda mais distorcida!
- A par do anterior trabalho de "manutenção", à medida que o dia se aproxima e que tudo se torna mais certo, há que negociar as iscas e decidir se vamos sós, acompanhados e, no caso dos que, não tendo barco próprio, vão com um amigo ou em Maritimo Turística, tentar antecipadamente falar com o mestre, auscultando que locais pensa percorrer e a que espécies se vai dirigir na pescaria que se avizinha.
- Já no final de toda esta preparação, importa preparar meticulosamente o material a usar, ou seja, iscas, montagens, canas, carretos, suplentes, roupa, comida; e, arrumá-los meticulosamente, de modo a que em qualquer situação sejam fáceis de encontrar sem se tornarem um empecilho para a acção de pesca!
E então, chegou o dia!
No meu caso, a saída para a pesca é um ponto alto da semana, atendendo a que todo o trabalho referido é feito a par com muitas horas do "outro trabalho", aquele que me permite os momentos que se seguem! Sei que para a maior parte de nós, aqueles que amamos esta actividade, as sensações serão concerteza idênticas!
O dia começou! Navegamos, sentimos o cheiro do mar misturado com o das iscas (qual Channel!?) e observamos tudo, como se fosse a última vez que o pudéssemos fazer, até que chegamos ao local e iniciamos os preparativos para que se iniciem as hostilidades!
Referir-me-ei, a partir deste momento, ao que se passa comigo a bordo, pois seria penoso e talvez pretencioso tentar abarcar todas as situações possíveis.
Chego ao pesqueiro, cheio de "fé", acreditando em tudo o que pensei nos últimos dias, começo a sondar e gosto do que vejo num determinado ponto! Paro o barco e apago da carta do GPS, a linha percorrida!
Preparo o ferro para largar sem precalços! Preparo as iscas e as canas, já com as montagens que anteriormente lhes distribuí, colocando-as nos locais onde vão "actuar" e dirijo-me ao leme!
Olho para o GPS, verifico a direcção da deriva entretanto efectuada pelo barco e preparo-me para aproar a esta e largar o ferro!
Sondo em linha paralela à deriva ou sobre esta, em sentido contrário! Encontro o fundo e os sinais mantêm-se! Dou desconto, tendo em conta se a aguagem é muita ou pouca e se o local onde vou largar o ferro pelo seu relevo e dureza de fundo me obrigará a dar mais ou menos cabo! Largo o ferro, acompanhando a passagem do cabo com a mão, e, assim que chega ao fundo, controlo a sua saída! Asseguro a fixação e dou cabo até que a sonda me dê sinais do fundo que previamente escolhi! Isto sem arriscar muito, pois se houver aguagem, terei de deixar que o barco fique antes do pesqueiro, para assegurar que as iscas vão cair no local desejado.
Outras coisas me deixam atento! Neste momento a aguagem e o vento são fracos! se aumentarem, o cabo esticará mais e poderei sair do pesqueiro! É verdade que a marcação de peixe está por todo o lado! Mas, nunca fiando! Estarei atento aos sinais!
Inicio a acção de pesca, não sem antes, iscar todas as montagens, excepto a da isca viva que fica a aguardar pelo peixe certo que uma das suas "amigas" há-de capturar!
As pescas chegam ao fundo, os "toques" sucedem-se! As iscas são roubadas! O peixe não se deixa apanhar! Também com anzóis e iscas desse tamanho! Querias o quê? Penso e insisto em não apanhar peixe miúdo! Os grandes hão-de aparecer! Mas há sinais que ainda não estão cá!?
Entra um Carapau! Boa! Entra outro! E agora uma Sargueta grande! Isto está a compor-se! Um Pargo pequeno! Onde está o teu pai ou o teu avô?
As cavalas já apareceram! Uma das pequenas já lá está, viva, a desafiar um qualquer cabeçudo!
De repente, oiço ranger e olho para a cana que está no apoio! Afocinhou e está aos tremeliques! Corro para ela e levanto-a! O que é? Está "arrochada"!? Não!!! A pedra não puxa para baixo!? Começo a luta e ao fim de alguns momentos tenho dois quilos e tal de Dourada a bordo! Vou para a tirar e não tenho tempo!? A cana que estava na mão e que coloquei no apoio, enquanto lutava com esta, teima em beijar o mar! Largo tudo! Tenho outra luta, mais violenta e mais afundante! Começo a vê-lo, é vermelho, lindo! Um Pargo quase do tamanho da Dourada! mas o que é isto? Os deuses devem estar loucos!?
Arrumo os peixes! Verifico os estralhos e os anzóis procurando sinais de enfraquecimento nuns e noutros! Os anzóis estão bons, mas o estralho que apanhou a dourada, necessita de ser mudado! Faço-o e começa tudo de novo! Vejo as horas e verifico que já passaram duas e meia, desde que comecei a pescar! Como é possível? Tenho seis peixes, todos de bom tamanho e nem dei por nada!? E a cana com isca viva? Está tudo igual!
Continuo, em tensão, mas as ratices roubam-me as iscas e vão ficando mais fracas! O que se passa? Mudo as iscas, mudo a forma de as iscar, contínua e alternadamente, nas duas canas! Nada acontece para além das ratices e do roubo descarado, continuamente efectuado por um gang submarino organizado!
Está na hora de mastigar alguma coisa, o que faço sem perder de vista as ponteiras das canas! Nada acontece! Agora as iscas já nem são roubadas, mas sim ratadas, vindo quase inteiras para cima!
As dúvidas acumulam-se! Já se passou uma hora e meia após a última captura! São três da tarde e começo a não acreditar no que estou a fazer, apercebendo-me que diminuí o esforço de pesca e que não estou a imprimir o ritmo inicial! Acorda homem! Para os sinais que isto teve, algo ainda tem de aparecer por aí!
Atiro-me às canas! Volto a acreditar! Aumento as iscadas! Desafio o peixe elevando e baixando as canas, parando-as por alguns momentos que me parecem uma eternidade! Subo as pescas ainda carregadas de iscas e troco-as, assegurando a sua frescura e enviando odores fortes lá para baixo! Doem-me os braços e tento não pensar nisso! Enquanto estou nisto, a coisa dá-se! Ponteira para o fundo e começa a luta! Outra Dourada! Esta é mais pequena! "Só" tem 1,900 kgs (isto só soube depois)!
A pesca continua, entra uma Bica do tamanho da Dourada, mais um Pargo de tamanho idêntico e dois mais pequenos! Isto tudo, para aí em 45 minutos! Abro a arca e penso que tenho de pesar o peixe! Um dia destes não merece chatices com as autoridades, por levar peixe a mais!
Peso o peixe e encontro 9,500 kgs mais a Dourada maior! Olho para as horas e são quatro e meia da tarde! Já tenho que chegue e vou sossegado para a terra! Acomodo tudo, ponho o motor em marcha e levanto o ferro! Aqueço a máquina e dirijo-me ao Porto! A pesca está feita!
Enquanto navego de regresso, comtemplo tudo e penso deleitado em todos os acontecimentos do dia: nas opções tomadas, no que apanhei porque acreditei e no que teria apanhado se acreditasse mais ou durante mais tempo seguido. Nunca o vou saber!? Também não é importante! Tenho o ego nas nuvens e aproveito, porque sei que outro dia, aí para a frente, virei certamente a pensar onde é que errei, se trabalhei, procurei e acreditei tanto!?
Esta é a descrição das minhas acções, pensamentos e estados de espírito, antes, durante e no final de uma jornada de pesca, sendo que, o antes, pertence a um qualquer dia e os durante e depois, correspondem ao dia que está referenciado aqui no blog, na entrada com o nome "O que parece ser necessário"!
É como veêm! Não pesquei no passado fim de semana e a melancolia deu-me para isto!
Deixo-vos uma foto de dias melhores!

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