quinta-feira, 16 de agosto de 2012

O meu dedo indicador direito, asneiras, pescarias...


Algumas histórias se iniciam centradas em qualquer parte de determinada anatomia. Hoje, enquanto olhava as fotos do último acidente desta minha, pensei nela e, sentindo-a como parte do meu percurso de vida, achei que devia falar sobre e a partir do bocado em causa.

Francamente... acho-o feio, mais encarquilhado e rugoso que o dono, quase insensível na ponta por via de um corte feito a olear uma corrente de bicicleta, aí pelos meus nove anos. A carne ficou algures entre a corrente e o carreto pedaleiro, deixando o osso à flor da pele, o que cria continuamente umas pelangas duras que se cortam ao mesmo tempo que a unha, características estas que, entre outras, destinaram este meu dedo a trabalhos duros para o resto da vida, já que sensibilidade é coisa que tem pouca e a textura obriga a substituição pelo dedo médio quando em trabalhos que impliquem contactos com outras carnes ou peles mais macias, entre outros.
Já para lidar com bicharada, linhas, nós, ferramentas e afins, assim como, para enfiar em buracos seleccionados que o mereçam, não há coisa melhor! Porque é que me lembrei do Miguel Relvas quando produzi esta última afirmação? Talvez por termos andado na mesma universidade, embora eu nunca tenha tido aulas com o tal reitor e tenha papado as cadeiras todas durante quase três anos, com 28 anos de serviço efectivo e já com bacharelato feito e mesmo assim ter aprendido! Bom... mas isto não interessa!

Voltando ao meu dedo... está visto que a dureza de utilização o torna cada vez mais duro, feio, mau e tão confiante que, após todos estes anos de pesca, a última das Moreias com que lidou quis testá-lo, quando o dono o colocou a jeito, deixando-lhe mais aqueles buracos, agora já cicatrizados e que brevemente contribuirão para a já evidente fealdade do pedaço.
A Moreia aparentava ter para aí uns dois quilos e meio, vinha anzolada pela boca e com evidente má disposição que se agravou quando se soltou do anzol e caiu no poço do barco, serpenteando e mordendo em seco de cabeça levantada. Não fui buscar o alicate comprido que uso nestes casos, agarrei um curto, o primeiro que tinha à mão e fiquei à espera de a poder prender por um dos maxilares... o erro já estava cometido, a pressa de voltar a pescar agravou-o, assim como o excesso de confiança nas capacidades do meu dedo...
O alicate desceu, a Moreia levantou a cabeça e mordeu a primeira coisa que lhe chamou a atenção - o meu dedo - que escapou rápido, evitando a preensão que se seguiria caso lá ficasse, embora cortado conforme imagem de abertura.
Senti a carnes a rasgar, vi o meu sangue que encarei como imposto a pagar pelos peixes já capturados e, após agarrar a Moreia e guardá-la como previsto, atirei-me aos curativos.
Primeiro a compressão, com um pano, para estancar o sangue, depois Betadine com fartura, seguido de penso rápido. Duas luvas elásticas daquelas dos médicos, uma sobre a outra, voltaram a permitir-me pescar,  de dedo espetado, posição que este conhece bem, devido à dureza de vida que tem levado, observando assim o resto da pescaria, em dia de calmaria, com nevoeiro matinal, parecendo aberto à saída do porto.


Na verdade, assim que entrámos no banco de névoa que se vê à proa, logo esta se mostrou cerrada o suficiente para obrigar à utilização do Radar e do GPS, por segurança de navegação, aparelhos estes que o meu dedo, ainda são nesta altura, conseguiu ligar, poupando o médio para outros trabalhos.


Mesmo com o acidente da minha extremidade, posso garantir-vos que este foi um dia de pesca brilhante... por tudo!
A companhia, a boa disposição e até as capturas que, não sendo nada de especial, foram acontecendo com algum ritmo, intervaladas por muito roubo de iscas, muitos testes de montagens, iscadas e sei lá mais o quê!?

Exemplares de nota, nem por isso, mas Parguitos como este do TóZé, entraram uns quantos e...


... o João Maria, conseguiu o melhor exemplar! Este que abaixo se mostra!


Comparando com pescarias anteriores, neste ano do Relvas, de subsídios voadores, de pouca pesca e consequente escrita por aqui; tudo indica que a actividade já se sente e que em breve outras maiores e melhores surpresas nos alegrarão!?

A este magnifico dia seguiram-se outros... melhores, não tão bons, mas onde a tónica foi escolher e pescar bem, sempre sentindo que a actividade e consequentes capturas dos nossos interlocutores se aproximam cada vez mais das características normais para a época.

Isso se tornou a verificar na passada quinta-feira, em que fui fazer algo que esporadicamente me faz falta e adoro... pescar a solo! Até o dedo, já sarado, se ria de tanto gozo!

Para variar, levantei-me com o Sol alto, sentindo ainda o prazer da degustação de uma Fraca de Molho, com o Zé Beicinho, ao jantar do dia anterior. Fui buscar a sardinha para iscar e beber o cafézinho da ordem, entre conversas com este e aquele, pescadores conhecidos, ouvindo as normais "bocas" relacionadas com a hora a que costumo ir para o mar, ou seja, qualquer uma, entre as dez e um quarto para o meio dia. Tudo bem... nada a que não consiga sobreviver.
O mar estava calmo, o ponteiro da temperatura do motor do Makaira, atingia lentamente os graus ideais para iniciar a aceleração até à velocidade de cruzeiro, e, o GPS ligado, já tinha o cursor no pesqueiro escolhido, indicando-me o rumo a seguir! Perfeito!
À chegada, a imagem de sonda mostrou actividade suficiente para arriscar o fundeio e atirei-me à acção de pesca, como se não houvesse amanhã.
Cana na mão, com sardinha iscada à posta; cana no caneiro, com um estralho comprido (2,5m), anzol 6/0 com sardinha iscada inteira; e, mãozinhas a pescar rápido que o roubo era frenético, sem dar descanso para manter iscas activas o que era o caso. Mesmo ao meu jeito!

Os Parguitos foram entrando, malandros, espaçados e intervalados com safios pequenos chatos e soltos na hora. O tamanho foi melhorando mas de grandes exemplares não reza a história deste dia, em que a caixa se foi compondo, como se vê abaixo.


O maior exemplar, até que me enganou, tanto por vir ferrado por fora da boca, quanto talvez, pela diferença abismal de luta, face aos companheiros já a jeito para a panela. Aqui está ele!


Certo é que a actividade nos pesqueiros começa a dar um ar de sua graça, embora os Pargos maiores não se mostrem muito interessados nas iscas, talvez por andarem atestados de pilados!? Esperemos que brevemente variem o menu ou que os ditos caranguejos cumpram com a sua função e desandem... parece praga!?
Uma coisa é certa, em conversa com pescadores profissionais de Sines, esta espécie tem estado por todo o lado, pois até nas 80 braças de água, comem bocados aos tamboris, nos aparelhos. Uma desgraça!

Se neste dia delicioso fui a solo e gostei, não foi com menos prazer que antevi o dia seguinte, em que o João Martins e os descendentes - a Susana e o Zé - me acompanhariam noutra pescaria, certamente no mesmo pesqueiro (importava testá-lo até à exaustão), onde lhes poderia passar conhecimentos enquanto usufruía da excelente companhia.

Também com eles, a hora de saída é daquelas que gosto e, se no dia anterior, só pensava em colocar linhas na água; neste dia, todos os pensamentos se dirigiam para que estivessem e pescassem bem.

Tudo correu pelo melhor... quase a papel químico em termos de capturas, com os Parguinhos pequenos, como este que a Susana mostra...


... um exemplar maior, irmão gémeo do que capturei no dia anterior, aqui apresentado pelo Zé e que sendo o seu primeiro maior, lhe abriu sorriso de orelha a orelha...


... e até um Safio com perto de 5 kg deu um ar da sua graça, coisa que não tinha acontecido antes.

Em mais um dia calmo, descontraído e com algum peixe, a imagem dos dois felizes contemplados, deixando o pai, apoiante de tempo inteiro (nem pescou...), completamente babado.


Já os dois dias que se seguiram, foram diferentes... pescas mais matutinas, menos peixe e mais enganos nos pesqueiros.

No Sábado, eu, o Vitor, o João, o Raimundo e o Pedro; no mesmo pesqueiro, quer por via da ausência de peixe, quer pelo vento que entrou; fomos obrigados a mudar para a terra.

Os Parguitos deram sinal, logo que chegámos, tanto pela mão do Pedro, quanto pela mão do João que teve a sua primeira captura "vermelha", pequena, mas primeira!


O pesqueiro mostrou-se diferente, com menos actividade, de tal forma que nem Safios apareceram.

Depois, durante todo o Santo Dia, procurámos, tentámos, mas nada mais se capturou de nota, obrigando-nos o vento a voltar ao porto mais cedo que o habitual. Tem dias assim e, ultimamente, não tem sido fácil. Mas ainda faltava um dia de pesca, desta vez com o Zé Beicinho, antes de voltar para o "descanso do guerreiro".

Saímos para a pesca, no Domingo, eu e o Zé, com novo pesqueiro em perspectiva, mais fora, já que a zona dos dias anteriores ficou pouco produtiva.

A pesca iniciou-se com bons sinais, muito roubo de iscas e perspectivas a condizer. Meia hora passada e entrou o primeiro, pequenote, logo seguido de mais um, passados uns quinze minutos.
A coisa prometia, embora em outros dias também não fosse além daquilo. Certo é que, não tinha passado meia hora e já um de 2,5 kg, entrava a bordo e outro grande se desferrava a meia água na cana do Zé.
Ficámos entusiasmados, mas, lentamente as Cavalas substituíram os Pargos e, todo o restante dia, com variantes contínuas de iscas e iscadas, nada mais entrou de jeito.
O meu dedo feio, apontou os pilados que iam passando, talvez os maiores culpados das irregularidades que se têm vindo a verificar. No entanto, tudo parece concorrer para que a coisa melhore!?

Aguardemos melhores dias!

Até lá, uma boa noite a todos os leitores!

15 comentários:

Anónimo disse...

Boas Ernesto! Finalmente... o teu "regresso"! Aqui venho basicamente todos os dias espiar para ver se tens novo relato e nada... também sei que o peixe pouco ou nada tem colaborado por estes tempos e perguntava a mim mesmo o que seria feito do Ernesto... Parabéns amigo e agora não pares com as fainas e sempre que te seja possível, posta por aqui qualquer coisa porque sabe sempre bem ler e ver os teus relatos!

Aquele abraço, Luis Ramalho

António Vinha disse...

Viva Ernesto

- Dedo e carnes macias!!? É pá....
Foi realmente preocupante aquela dentada... são coisas do oficio.

Tirando o acidente, foi talvez um dos dias mais divertidos que passei na pesca contigo e com os malucos do João Maria e do Nuno.

- Espero que o próximo encontro seja em breve...mas desta vez sem acidentes e sem carangueijos... irra até enjoa.

Abraço

TóZé

Anónimo disse...

Viva Ernesto, bem vindo de volta a este teu/nosso espaço que tanta falta nos faz. Este ano realmente as coisas têm estado um pouco diferentes, pilado desde a fondura até à borda de água. Nunca tinha visto nada assim. Talvez seja uma boa aprendizagem para os anos futuros...
De qualquer maneira, a hora deles sairem estará a chegar e mesmo que não chegue tão depressa, o peixe poderá ter tendência a mudar a alimentação quando passa muito tempo a comer o mesmo.?? Quem sabe se essa hora não está a chegar

Abraço
João Carlos Silva

Anónimo disse...

Bom tarde Ernesto

Eu estava lá e vi-o a atirar-se ao dedo com dores , se tem sido aquela que apanhei á uns meses atrás é que eram elas , e nesta entrada explica o que vindo a passar-se neste ano tão Ordinário que tem sido de pesca , e da nossa ultima Eu não tive sorte ou mesmo falta de jeito , mas como se diz - melhores dias viram ou não . è sempre um enorme prazer pescar rodeado de amigos , pelo que a min me toca . no proximo dia vou faltar com pena pesarosa , mas é as Vacanses em familia lá para outros mares .
Um abraço Nuno Mira

P.s. Esqueçeu de falar que fomos acordar ao barco o Mestre do Makaira estava ferradinho nos braços do Neptuno , e da cagada no Mar , ai ta até parece da terra do Carrrapau e da sarrdinha

Anónimo disse...

A tua pesca de muita qualidade, como te invejo (no bom sentido). Quanto ao dedo foi um grande azar, felizmente sem consequências maiores, eu quando tenho um azar na pesca com anzois ou outa coisa qualquer também costumo pensar que serve pelo menos para relembrar o respeito que tenho pelos peixes e que para praticar este nosso desporto que tanto gostamos também temos de lhes causar sofrimento.. não deixa de ser a lei da vida, ficamos a aguardar mais relatos de preferência sem percalços!! Gostei muitíssimo da tirada do relvas. Aliás gostava de ver um dia o movimento dos que trabalham para manter pançudos, mas isso já é outra conversa. Boas pescas! Filipe

Ernesto Lima disse...

Viva Pessoal!

A todos agradeço os comentários!

Das notas por vós realçadas, pois a dificuldade em conseguir maiores, este ano, salvo em certos locais onde não dá para ir com o meu barco, não tem sido fácil; se bem que, com mais idas, acabam por se encontrar. Este foi talvez o ano que menos vezes fui ao mar, por razões essencialmente particulares.

Quanto à brincadeira política... porque não? eles têm-nos lixado bem a vida!

Quanto ao comentário do Nuno Mira... não comento! Rsrsrrsrsrr

Abraço

Os Pescas disse...



È com enorme felicidade e prazer com que leio os teus relatos amigo Ernesto...:-)
Sempre escritos de uma forma inteligente, humorada, perspicaz e experiente de um verdadeiro Lobo do Mar..:-)
Infelizmente ou não, eu não me lembro de um ano de tanto pilado Ernesto, pode se dizer que virou uma praga ao longo da nossa costa.
Bom para os peixes, mas muito mau para nós..lol
Um grande abraço amigo e espero que dentro em breve voltes a navegar.

Luis Malabar

Augusto disse...

Boa tarde ou Boa noite rss
É com grande alegria que leio mais um comentário e como sempre os escreves com maestria.
É sempre bom ter um ¨dedinho¨de prosa.

Forte abraço aqui do Brasil

Ernesto Lima disse...

Aos novos comentadores agradeço as palavras escritas!

Ao Luís:

É verdade... os pilados poderão de facto ter uma palavra quanto ao que se tem passado, se bem que, indo, sempre se consegue dar a volta ao texto.

Ao Augusto:

Um abraço para Terras de Santa Cruz e gostei do pormenor do "dedinho"!

Abraço para todos

Anónimo disse...

Olá novamente Ernesto, fiquei curioso com o facto de não conseguires ir com o teu barco a locais mais distantes, isso deve-se ao tamanho do barco, motor, dificuldade a fundear? Não sei se é uma pergunta palerma mas... obrigado. Filipe

Ernesto Lima disse...

Viva Filipe!

De facto, da maneira como escrevi, é pouco explicito!

A razão prende-se com a legalização que o barco tem - Classe 4 - que só permite ir a seis milhas da costa, o que me limita a ida a certos pesqueiros que estão mais afastados e onde sei que se têm capturado bons exemplares; o caso do "Arrifo", frente a Vila Nova de Mil Fontes, por exemplo.

Claro que isto não funciona como desculpa... não é certamente o único pesqueiro com grandes exemplares!? No entanto, devido às suas características é de facto um local de concentração da "bicharada" maior.

Abraço

Anónimo disse...

Ok obrigado pela explicação, não me lembrei do óbvio! Estes pormenores dos barcos despertam-me sempre curiosidade. Filipe

Ernesto Lima disse...

Pois é Filipe!

Mesmo andando sempre em cima de tudo o que à lei respeita para quem tem barco, a PM de Sines já me levantou dois autos, ambos contestados por mim nos termos da lei, um deles em que só paguei as custas ilegalmente, devido ao facto da respectiva contestação ser muito mais cara que as custas da altura (44,50 euros); e outro, que está para ser respondido à dois anos e meio e que, atendendo à lei e aos procedimentos, caso tentem, vai para tribunal.
Não tenho vontade de arriscar seja o que for minimamente fora da lei. Não vale a pena e acaba com a diversão.
Fico admirado é com muitos de nós que assiduamente se mostram preocupados com a falta de fiscalização. Por ali, é coisa que não falta!

Abraço

João Martins disse...

Entre os dias especiais que são os da pesca no Makaira o de sexta foi ainda mais especial, já que conseguimos que os "meninos" do mergulho participassem numa pesca como sempre adulta e responsável, com critérios sérios no tocante a espécies e tamanhos das capturas
Eu fiz uma pesca "sem cana" mas não menos interessante, já que pude comparar no mesmo cenário a actuação de um pescador carregado de saber e experiência e dois iniciados, um bem dócil às orientações e outro mais resistente a elas
Se ainda tivesse dúvidas, tive a prova de que os resultados não acontecem por acaso e muito menos por sorte
Aprendi e muito

Um abraço e mais um muito obrigado, Ernesto
João Martins

Ernesto Lima disse...

Viva João!

Se há coisas que gosto é levar que se está a iniciar ou que nunca pescou, sem desprimor para outros.

Ver os outros descobrir e aprender com eles enquanto o fazem é algo, para mim, sublime!

Foi de facto um dia excelente!

Forte abraço para a família Martins!